Nos dias 24 e 25 de Agosto, o site Aviação em Floripa teve a honra em conhecer o Esquadrão VF-1, única Unidade Aérea de Caça da Marinha do Brasil, que opera com os jatos McDonnell Douglas A-4 Skyhawk, denominados na Aviação Naval como AF-1 Falcão. O convite para a visita partiu do próprio Comandante do Esquadrão, Capitão de Fragata José Assunção Chaves Neto, resultado da matéria que o site publicou no início deste ano a respeito da participação da Unidade Aérea no Exercício ASPIRANTEX 2022, realizado em Janeiro, na qual duas aeronaves do Esquadrão operaram a partir de Florianópolis/SC em apoio aos navios da Esquadra participantes da manobra. A partir de agora, embarque conosco e venha conhecer o "Ninho dos Falcões".
Um pouco de história
Em 1965, a Aviação Naval perdeu o direito de operar aviões, entregando todos os seus meios de asa fixa para a Força Aérea Brasileira (FAB) que por sua vez, repassou seus helicópteros de uso naval para a Marinha do Brasil. Essa situação começou a mudar em 1996, quando em 29 de julho daquele ano, o então Ministro da Marinha, Almirante de Esquadra Mauro César Rodrigues Pereira encaminhou ao Presidente da República à época, Fernando Henrique Cardoso, uma Carta de Exposição de Motivos na qual detalhava as necessidades da Marinha para a retomada de operações com aviões para atuarem em conjunto com as suas forças navais e terrestres. Assim, pelo Decreto Presidencial nº 2.538, de 8 de abril de 1998, ficou estabelecido em seu Artigo 1º que: “a Marinha disporá de aviões e helicópteros destinados ao guarnecimento dos navios de superfície e helicópteros de emprego geral, todos orgânicos e por ela operados, necessários ao cumprimento de sua destinação constitucional”. Enquanto ainda se aguardava uma decisão sobre a autorização para operar aviões, foram iniciados estudos e buscas no mercado internacional por modelos que se adequassem às necessidades da Marinha, chegando-se a um lote de 20 aeronaves McDonnell Douglas A-4KU (monopostas) mais 3 TA-4KU (bipostas) Skyhawk II, operadas anteriormente pela Força Aérea do Kuwait e que apresentavam uma relação custo/benefício excelente, em virtude das poucas horas voadas por célula, condições de armazenamento e pacote logístico composto por aviônicos, armamento, material de apoio e sobressalentes.
Com o sinal verde dado à Marinha para o retorno das operações com aeronaves de asa fixa, a compra foi efetivada e os aviões, juntamente com todos os seus materiais e equipamentos chegaram por via marítima ao Brasil no dia 5 de Setembro de 1998, desembarcando em Arraial do Cabo/RJ, de onde foram transportados por carretas até a Base Aérea Naval de São Pedro da Aldeia (BAeNSPA), localizada na cidade de mesmo nome, situada no litoral norte do Estado do Rio de Janeiro e distante a apenas 22 km de Arraial do Cabo. Aqui passaram a ser chamados de "Falcão" e designados como AF-1 para os monopostos (recebendo as matrículas N-1001 a N-1020) e os aviões de dois assentos como AF-1A (matrículas N-1021 a N-1023). O Primeiro Esquadrão de Aviões de Interceptação e Ataque (VF-1) foi criado logo em seguida, pela Portaria Ministerial nº 256, de 2 de Outubro de 1998 com a missão de "Executar a defesa aérea da Força Naval e garantir a superioridade aérea necessária à aplicação do Poder Naval onde e quando este se fizer necessário". O primeiro voo em território brasileiro sob os comandos de um Aviador da Marinha aconteceu em Maio de 2000, cabendo a primazia ao então Capitão-Tenente José Vicente Alvarenga Filho. Os anos seguintes testemunharam o rápido desenvolvimento operacional e o estabelecimento por parte do Esquadrão VF-1 de suas doutrinas e táticas de emprego, com o domínio das operações de pouso e decolagem embarcados, a bordo do Navio Aeródromo Ligeiro Minas Gerais (A-11) e do seu sucessor, o Navio Aeródromo São Paulo (A-12), além da interoperabilidade com os demais meios navais da Esquadra, com os Fuzileiros Navais e o emprego em manobras conjuntas com as Forças irmãs, Exército e Força Aérea Brasileira.
Linha de voo composta por dois AF-1B Falcão.
Decorridos quase dez anos de operação com o Skyhawk na Marinha, decidiu-se pela sua modernização, sendo contratada a Embraer Defesa e Segurança (EDS) para realizá-la. O contrato foi assinado em Abril de 2009 e envolvia inicialmente doze aeronaves (depois reduzido para sete) contemplando cinco exemplares monopostos e dois bipostos, os quais passaram a ser designados como AF-1B/AF-1C respectivamente. Os aviões modernizados incorporaram um novo radar multimissão de fabricação israelense, modernos sensores, dispositivos de auto-defesa, novos equipamentos de comunicação e navegação, além de sistemas aperfeiçoados de geração de energia e de oxigênio, entre outras melhorias. Dentro da cabine muita coisa mudou também, com a adoção de um HUD (Head-Up Display, equipamento que projeta ao nível dos olhos do piloto informações cruciais durante o voo), HOTAS (Hands On Throttle and Stick, permitindo que o controle de todas as funções vitais durante uma missão de combate estejam concentradas na manete de potência e no manche) e a substituição de boa parte dos mostradores analógicos por duas telas multifuncionais, chamadas de CMFD (Color Multi-Funcion Display). O contrato também incluiu a completa revisão do motor Pratt & Whitney J52-P-408 que equipa os aviões. O protótipo usado como plataforma de testes e certificação foi o A-4 com a matrícula N-1011, tendo feito seu voo inaugural com a nova configuração em 13 de Julho de 2013. A entrega dos exemplares modernizados iniciou-se em Maio de 2015 e foi concluída em Abril deste ano. Acompanhe na tabela abaixo, quais aeronaves foram modernizadas bem como diversas informações sobre cada uma delas:
Fonte: https://moraisvinna.blogspot.com/2009/09/relembrando-kuwait-air-force-skyhawks.html
* Protótipo do Programa de Modernização, perdido em um acidente ocorrido em 26/07/2016. Estuda-se no momento a possibilidade de mais uma aeronave monoposta do acervo do Esquadrão ser enviada para a Embraer com o intuito de substituir o N-1011, recompletando assim a quantidade original de sete aviões modernizados.
** Exemplar recebido em 06/09/2019 e danificado durante decolagem na Base Aérea Naval de São Pedro da Aldeia (BAeNSPA) em 23 de Outubro do mesmo ano, estando no momento em processo de recuperação.
Conhecendo o "Ninho dos Falcões"
Vista da fachada principal do prédio do Esquadrão VF-1. Crédito: Cb Caio/EsqdVF-1.
O Esquadrão VF-1 ocupa um prédio amplo e moderno com mais de 6 mil metros quadrados de área construída, possuindo uma estrutura completa para abrigar os aviões e fornecer todo o suporte para a operação dos mesmos. A Unidade Aérea é composta por três grandes Departamentos, que são os de Operações, de Manutenção e o Administrativo. A edificação conta com dois amplos hangares, separados por uma construção com dois pavimentos que agrupa todos os setores, ambientes e salas necessárias para os pilotos, o corpo técnico e administrativo da Unidade Aérea cumprirem suas funções. Percorremos todas as instalações do prédio que nos foram autorizadas e permitidas a serem mostradas e passamos a partir de agora a apresentar as principais delas aos nossos leitores. Abaixo de cada foto seguirá sempre que necessário, um pequeno texto identificando o local e contendo algumas informações sobre o mesmo.
Hangar principal, onde ficam as aeronaves prontas para as operações de voo.
Este local fica próximo à porta do hangar principal e é aqui que os pilotos terminam de se equiparem para o voo. Cada avião tem a sua pasta própria contendo todas as informações sobre as condições atuais da aeronave anotadas pela Equipe de Manutenção e cabe aos pilotos, aceitarem ou não o avião para o voo. Ao retornarem da missão é aqui também que os pilotos retiram os seus equipamentos e reportam algum problema com a aeronave que possa ter ocorrido em voo, antes de seguirem para a reunião de debriefing.
No interior do hangar de manutenção ficam as aeronaves operacionais que necessitam de algum tipo de intervencão ou apronto pelas equipes técnicas antes de serem levados para a linha do voo. Aqui também ficam armazenados alguns aviões que não passaram pelo processo de modernização, além de equipamentos de apoio e o ferramental necessário para o reparo dos mesmos. Anexo ao hangar existem diversas salas e oficinas relacionadas com a atividade de manutenção, cada uma delas ligada a uma área específica, como armamento, motores, estrutura, aviônica, entre outras.
Os principais setores do Esquadrão estão localizados no segundo pavimento do prédio. Ali se concentram as Salas do Comandante, do Imediato, as Divisões e Departamentos responsáveis pela operacionalidade da Unidade Aérea. Para quem gosta de detalhes e objetos ligados à Aviação de Caça, o local do prédio que mais chama a atenção é a chamada Praça D'Armas, uma espécie de Sala de Estar para os pilotos e para receber visitantes. Ali estão colocados diversos itens relacionados com as aeronaves servindo como peças de decoração. Os Esquadrões de Caça gostam de enfeitar estes espaços com artefatos que remetem ao seu dia a dia e aos equipamentos que utilizam. E o Esquadrão VF-1 não foge a essa regra.
Sistema de pouso com luzes, utilizado nos Navios Aeródromos.
Gancho de parada colocado sobre a "Ordem dos Falcões", quadro contendo as placas com os nomes dos pilotos que fazem ou já fizeram parte do Esquadrão, além de outras pessoas que fizeram jus a esta distinção.
O cuidado aos detalhes impressiona. O puxador da porta do banheiro foi feito com a parte superior do manche de uma aeronave AF-1 Falcão.
Sala do Comandante.
Sala do Imediato.
Na parede entre as Salas do Comandante e do Imediato, encontra-se um belíssimo painel mostrando uma aeronave AF-1 Falcão decolando do NAe São Paulo.
Quadros com as Comendas recebidas pelo Esquadrão VF-1. A Unidade Aérea possui a Ordem do Mérito Aeronáutico e a Medalha Mérito Tamandaré.
Galeria de Comandantes do Esquadrão VF-1, atualmente comandado pelo Capitão de Fragata José Assunção Chaves Neto.
No pavimento superior ainda se encontram outras dependências, como a Sala de Briefing, Sala de Navegação, Divisão de Suprimentos, Divisão de Secretaria e Comunicações, Paiol de Suprimentos, Departamento de Segurança, Departamento de Operações e a Sala do Subofial-Mor, uma espécie de braço direito ou assessor do Comandante para assuntos ligados ao cotidiano da Organização Militar, funcionando como um elo de ligação entre a Guarnição e o Comando. Geralmente este cargo é exercido por um Graduado com grande experiência e vivência de Marinha. No caso do Esquadrão VF-1, a função é nova e atualmente ocupada pelo Suboficial Barros, que foi o nosso anfitrião durante a visita às dependências da Unidade Aérea.
Sala de Briefing, local onde os pilotos e equipe envolvida nas missões se reúnem para discutir detalhes do voo ou de uma operação.
Departamento de Operações, o cérebro da Unidade Aérea, onde são planejadas todos os voos do Esquadrão, assim como a qualificação e adestramento dos pilotos, controle de combustível e as missões a serem cumpridas.
Sala do Oficial de Operações, cargo atualmente exercido pelo Capitão de Corveta Anapurús.
Sobre a mesa, um busto do Almirante Tamandaré e as maquetes de um A-29B Super Tucano e do AF-1 Falcão, colocadas sobre os cachecóis de Esquadrões de Treinamento da FAB. Os pilotos da Marinha têm sua formação em asa fixa na Academia da Força Aérea (AFA) e depois seguem para Natal/RN, para fazer o Curso de Formação de Piloto de Caça no 2º/5º GAv, o Esquadrão Joker.
Sala do Suboficial-Mor. Para exercer essa função, o militar tem que ser voluntário e precisa ter um bom relacionamento com o efetivo, além de conhecer muito bem todos os departamentos e setores da Organização Militar. O cargo é indicação do Comandante e o escolhido fica pelo menos dois anos à frente da função. Atualmente o Suboficial-Mor do Esquadrão VF-1 é o SO Barros, por curiosidade o primeiro também, pois esse programa é recente na Marinha.
Área central no térreo ligando os dois hangares.
Ladeando a pintura na parede, encontram-se dois quadros contendo a "Ordem dos Falcões Guardiões" com os nomes dos Graduados em quatro níveis: Bronze, Prata, Ouro e Diamante.
Placa em homenagem à primeira Guarnição (Comandante, Oficiais e Praças) do Esquadrão VF-1.
Como uma forma de homenagear e agradecer ao convite para conhecer as instalações do Esquadrão VF-1, o Editor do site Aviação em Floripa entregou ao seu Comandante, um quadro da Aeronave AF-1B Falcão com a matrícula N-1001, fotografado em Florianópolis/SC durante o Exercício ASPIRANTEX 2022, quando duas aeronaves da Unidade Aérea participaram do treinamento conjunto com navios da Esquadra.
Momento da entrega do quadro. Crédito: CT Raggio
Palavras finais
Ao término da visita, o que pudemos constatar é que existe por parte de todos os militares que integram a Unidade Aérea, desde o Graduado mais moderno até o Comandante, um grande orgulho e satisfação em fazer parte deste seleto grupo, sentimentos estes se notam em cada detalhe, em cada dependência, em cada ambiente que tivemos acesso. Saímos com a certeza de que o trabalho ali é realizado com amor, profissionalismo e dedicação. Fiéis ao legado deixado por aqueles que forjaram sua história, os Falcões de hoje seguem voando cada vez mais alto para garantir do Ar, a Defesa do Mar. Gostaríamos de agradecer ao Capitão de Fragata Assunção, Comandante do Esquadrão VF-1, pelo convite em conhecer a Unidade Aérea, ao Suboficial-Mor Barros, que conduziu de forma cordial e prestativa a nossa visita pelas dependências da Organização Militar. Enfim, a todos que de alguma forma, contribuíram para esta matéria.
5 comentários:
Fotos sensacionais, e bela reportagem, a sala de descanso dos pilotos muito bem decorada, queria uma assim.
Parabéns, mais uma bela reportagem.
Parabéns, texto muito interessante e belas fotos. Bacana poder conhecer parte da história da nossa aviação naval.
Deixo registrado, mais uma vez, meus parabéns pelo belíssimo trabalho. Não à toa, o comando dessa unidade também tem prestigiado seus excelentes textos com abordagens minuciosas.
Um trabalho digno da grandeza desse esquadrão.
Parabéns pela oportunidade em visitar e voar com o VF-1, tenho muito carinho por esse Esquadrão. Matéria rica em detalhes, excelente trabalho!
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